Como de costume, às seis horas, sai de casa em direção a padaria para comprar aquele pão quentinho que alegra a noite, pra comer com manteiga e um cafezinho com leite; ah, aquele cheirinho de pão que dá água na boca! É que pessoas com fome só pensam em comida.
Depois daquela fila no padeiro, quase eterna, finalmente cheguei ao caixa. E como pessoas com fome só pensam em comida, resolvi que um açaí com morango cairia tão bem. E não me pergunte: "que mistura louca é essa?"
Foi nessa hora que lhe percebi. Perguntei o valor, porque afinal de contas "eu não enxergo bem de longe", e você me respondeu, "ah... também não enxergo!". A risada foi espontânea, tá? Entenda como gratidão por não me sentir a única estranha que usa óculos e não enxerga de longe.
Reparei na armação preta do seu óculos de lentes retangulares, na barba preta e grande, mas bem cuidada, na pele alva e na boca. Foi paixão à primeira vista, ou à primeira boca?
Seus lábios contrastavam com sua pele e a barba. Uma boca rosada, de lábios não tão carnudos nem finos, mas tão perceptíveis.
Sei que pessoas normais se falam olhando nos olhos, mas sua boca brilhava e movimentava de uma forma tão diferente, que me fez esquecer dos outros elementos que compõe um rosto. Confirmo, foi paixão à primeira vista. A primeira boca que prestei atenção naquele dia. Não é estranho. É só, incomum!
Enquanto você falava do pão suado dentro da sacola fechada, eu estava parada tentando entender aquela situação, minha com a sua boca. Moço, parecia até que você tinha tomado meu açaí antes dele ficar pronto.
Foi aí que lembrei do meu pedido. "Ah, o pão! Tá certo". Peguei meu açaí e fui para casa. Quem sabe outro dia nos encontremos para que eu possa admirar seus lábios novamente.

Camila Matos
editado por: Werterley Martins da Cruz
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